Quando
o professor entrou na classe estávamos, como sempre,
no maior papo. Juliana, espalhafatosa, tentava organizar
uma festinha. Estava difícil, ninguém entrava
em acordo sobre "quem levaria o quê". Resolvemos
deixar o assunto para o intervalo.
O professor Raul nos convidou para uma viagem, de fantasia, é claro, e
aceitamos. Não entendi bem o que seria esta "viagem", mas fiquei
curioso.
O
professor nos contou uma história:
-
São seis horas da tarde. Vocês estão
no ônibus escolar, voltando para suas casas. Percorrem
uma rua no centro da cidade, que conhecem bem, quando,
de repente, surge uma floresta em torno do ônibus.
O motorista, assustado, dá um grito e mete o pé no
freio. O ônibus pára alguns centímetros
antes de bater numa enorme árvore. E agora, o que
farão?
Olhamo-nos
sem entender bem o que ele queria dizer com isto. Jorge
expressou a dúvida de todos nós:
-
Faremos o quê, professor?
-
Ora, vocês estão num ônibus cercado
por uma floresta que não deveria existir aí.
Usem a imaginação. Se isso estivesse mesmo
acontecendo, que atitude tomariam?
-
Ah! Sairia do ônibus - sugeriu Francisca.
-
Muito bem. Quem mais sairia? - perguntou o professor.
Concordamos
em coro. Iríamos todos para fora.
-
Vocês estão do lado de fora do ônibus,
em meio a uma floresta densa, tropical. Sentem um calor
abafado. Está bem mais quente que há pouco,
quando sairam da escola. Vocês tentam imaginar o
que aconteceu.
-
O ônibus perdeu a direção e entrou
num parque - concluiu Orlando.
-
Que nada - brincou Angela - um cientista maluco criou uma
fórmula que faz as plantas crescerem num milésimo
de segundo e jogou em cima do nosso velho ônibus.
Enquanto
ríamos, o professor continuou: - Vocês ouvem
um ruído grave, como de ondas batendo numa praia.
Um de vocês sobe em cima do ônibus e vê,
a pouca distância, o mar. Há uma praia aí.
Vocês não estão em sua cidade.
-
Mas professor, aqui na cidade tem praia - reagiu Janaina.
-
Nesta história vocês moram numa cidade sem
praia - corrigiu o professor.
-
Vamos para a praia, então - adiantou-se Sílvia,
já entrando no espírito da brincadeira.
-
Vocês correm para lá e agora, em terreno aberto,
podem ver o teto do ônibus aparecendo em meio à vegetação.
Há também uma montanha, não muito
alta, relativamente perto de onde estão.
-
Há alguém na praia? - perguntei.
-
Não - diz o professor - a praia tem cerca de três
quilômetros de extensão e não há nenhum
sinal de vida humana. No horizonte só se vê o
mar aberto. Está bastante quente, o sol muito forte.
Célia
chama o professor para lhe perguntar algo: - Professor,
em que...
Ele
retruca, sem lhe dar tempo: - A partir de agora chamem-me
de "mestre".
-
Sim, mestre.
-
Pois não, mestre.
- À sua
disposição, mestre - brincamos.
O
mestre explicou: - Chamamos de "mestre" a pessoa
que coordena a história, a aventura. Isto é necessário
porque estamos vivendo numa situação diferente
da que estávamos na sala de aula. Enquanto durar
esta aventura, não sou mais o professor Raul.
-
Certo, mestre. Em que posição está o
sol? -completou Célia.
-
Está a 45 graus, mais ou menos.
-
A leste ou oeste?
-
Vocês não têm bússola. Não
há como saber isto agora.
-
Se esperarmos mais alguns minutos - Janaina sugeriu - saberemos.
Se o Sol subir no céu, está a leste. Se descer,
está a oeste, entardecendo portanto.
-
Passam-se trinta minutos e vocês notam que o Sol
subiu alguns graus no céu.
-
Puxa! Então agora devem ser nove ou dez horas da
manhã - concluí - mas se estávamos
voltando da aula às seis da tarde, como é que
pode ser de manhã, novamente?
-
E eu, que pensava estar livre da aula por hoje, olha ela
aí de novo - disse Carlos, com ar chateado.
-
Já entendi - diz Orlando, o apaixonado por ficção
científica - por um desvio no contínuo espaço-tempo
fomos transportados para outro lugar do planeta Terra. É a
Terra, já que o Sol é o mesmo. Certo, mestre?
-
O Sol é o mesmo, com certeza, e está na direção
do quadro negro aqui da sala.
-
Então, pelo horário, devemos estar do outro
lado do globo, e na região equatorial, pelo calor
e porque a floresta é tropical - concluí.
-
Mas onde? - pergunta Sílvia.
-
Vocês deixaram seu material escolar no ônibus.
Podem consultar o Atlas - sugeriu o mestre.
Pegamos
o Atlas do Cláudio e o abrimos ansiosos numa mesa.
Uns por cima dos outros tentávamos nos localizar.
O mapa era pequeno para caberem tantos dedos, apontando
aqui e ali.
-
Cuidado com meu Atlas! - ordenou, preocupado, Cláudio.
Verificamos
o mapa-mundi com os fusos horários. Fizemos alguns
cálculos e concluímos que estávamos
em algum lugar do Oceano Pacífico, na altura do
equador.
-
Caramba! - alertou Flávio - devemos estar em alguma
ilha deserta!
-
Ou com nativos, comedores de gente - assustou Angela.
-
E se subíssemos na montanha que vemos daqui, para
verificar se é mesmo uma ilha? - sugeri.
-
Você vai até a montanha e lá de cima
percebe que estão mesmo numa pequena ilha, que parece
deserta - completou o mestre - na volta, traz algumas frutas
que colheu pelo caminho e as distribui a todos.
-
Precisamos conseguir mais comida e água - considerou
Fernando.
-
E achar alguma maneira de sair daqui - completou Célia.
-
Não podemos construir uma balsa e sair remando porque
não sabemos para onde - emendou Carlos, preocupado.
-
Mas, talvez... - pensava Francisca - ... temos algum rádio?
-
O ônibus tem um rádio - informou o mestre.
-
Ligamos o rádio para ver se captamos algo - disse
Francisca.
-
Nada, só estática - o mestre informou.
-
Se levarmos o rádio para o alto da montanha, e fizermos
uma antena alta, talvez captemos algo - sugeri.
-
Muito bem. Vocês levam o rádio à montanha
e conseguem captar uma estação. Parece um
noticiário numa língua estranha e vocês
nada compreendem. Apontando a antena para nordeste o sinal
se torna mais forte.
-
Onde é o nordeste? - pergunta Beatriz.
-
Se soubermos onde é o leste, saberemos onde é o
nordeste - afirmou Marcos.
Todos
abrimos os braços ao mesmo tempo, como nos ensinou
o professor Raul e tentamos deduzir onde era o nordeste,
apontando o braço direito para onde estava o sol,
na direção do quadro negro em nossa sala,
como o mestre havia informado.
Marco
Antonio veio com uma idéia interessante: - Poderíamos
cortar o teto do ônibus e fazer uma balsa com ele,
já que este ônibus não sai daqui mesmo.
Juliana
completou a idéia: - Podemos desmontar os pneus
e usar as câmaras para dar flutuabilidade à balsa.
-
E temos o rádio para nos dar a direção
aproximada da civilização - completou Cláudio.
Neste
momento, quebrando o clima, toca o sinal de fim de aula.
Algumas manifestações de frustração
e o professor dá uma sugestão:
-
Vamos continuar esta aventura na próxima aula, mas,
enquanto isso, vocês poderiam preparar um diário,
já que todo viajante perdido tem um, relatando os
fatos que podem sugerir a localização desta
ilha e como sair dela. Poderiam também construir
uma bússola, usando materiais que deveriam existir
num ônibus escolar, para assegurar nossa localização.
Raul
não disse, mas iria trazer, para a próxima
aula, um mapa estelar da região da Polinésia.
Queria utilizar o interesse despertado para entusiasmar
seus alunos no estudo das estrelas e constelações.
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